segunda-feira, 29 de março de 2010

Sexo, chimarrão e bolo frito


Texto publicado no Pasquim Sul, em 30.04.87


Acordei com fome. Descolei um ovo com o vizinho do vinte e dois e Dona Maria, do térreo, alcançou-me uns bolos fritos. Um dia ainda traço essa velha. Que coração! Eu sou assim: simpático, chegadinho.
A campainha tocou e eu senti cheiro de mulher. Sou muito sensível. Era ela. Não a Dona Maria. Outra. Ainda bem que eram dois bolinhos. (O ovo já tinha bailado!). Aperitivei-a com os olhos e convidei:
- Quer almoçar, baby?
- Neca – respondeu, surpresa.
- E eu Mig, como os jatos russos – aproveitei a deixa para me apresentar.
- ...
- Dizem que sou muito rápido. Por isso, o apelido. Acho ótimo. O tempo voa e eu sigo meio junto.
Olhou-me estranhamente. Pensei que podia ser fome e ofereci o bolinho menor. Eu sou assim: gentil, educado, maternal. Agradeceu, assentindo com a cabeça envolta em bobs cor-de-rosa.
- Muito prazer – ela disse, estendendo a mão.
Botei o pau na mão dela e completei:
- Pra você, também, baby – e dei um risadão. (Eu sou ótimo!).
Estaquearam-se. Ela e ele. Sacudiu-o efusivamente como se fosse a mão do presidente ou do papa. Quase fui. Pena que ela parou.
- Preciso ir – ela disse, sem olhar para baixo.
- Não toma um chimarrão?
Sacaram o lance? Eu sou assim, ágil, perspicaz. E passei a cuia.
Pegou-a com a mão livre. Tudo certinho, pensei. Numa dessas ela se confunde. Aí deu para ela, sou realmente muito rápido.
Que nada! Largou meu pau. Em parte foi bom que já estava gangrenando. Ouvi o ronco do mate.
- Gostoso – ela disse, devolvendo a cuia. Estava nervosa. Devia ser a emoção.
- Você ainda não viu nada, baby! – disse eu, aproveitando a deixa novamente.
Tirei o roupão verde e fiquei só de meias. Andei nu pela peça. Dancei um tango e depois fiz a dança do ventre. Rolei no tapete. Esfreguei eroticamente a bunda na maçaneta. Abri a boca e sacudi agilmente a língua.
Ela continuava estaqueada mas eu percebi que já estava cedendo: havia piscado pelo menos duas vezes.
- Você não é o sindico? – ouvi-a perguntar num lamento.
- Ano que vem, darling – sou malandro, nunca respondo não.
E insisti, conselheiro:
- Baby, você precisa de um amante, não de um administrador. Antes o sexo, depois o IPTU.
Achei que havia sido convincente. Eu sou demais.
Deu um sorriso. Aproximou a boca carnuda, os lábios fortes no meu ouvido cartilaginoso. Senti o bafo nas entranhas e tremi. Agarrou firme o meu pescoço (no pau, no pau, implorei), sacudiu-o com vigor e disse pausadamente:
- Ô meu! Vai tomar no teu cu!
E saiu porta afora, alucinada. Perdeu um dos bobs cor-de-rosa no hall de entrada.
Mal educada, pensei, nem comeu o bolinho. E guardei o bobs na caixinha dos recuerdos.

                                                                             - Miguel da Costa Franco -

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