segunda-feira, 29 de março de 2010

Risquei a Janete do meu caderninho


Texto publicado no Pasquim Sul, em 04.12.86


Arrastá-la até que foi fácil, sou bom de papo. Difícil mesmo foi despistar as outras. Eu sou terrível, fodão, irresistível. Assim que tomamos a escadaria, comentei:
- Bundão!
Ela aumentou os requebros e continuou a subir a escada. As manchas roxas nas pernas davam-lhe um toque especial. A bainha descosida da saia também. Taquei a mão:
- Baita gomão, baby!
Eu sou assim, atrevido, bagaço.
Ela desviou-se e riu safadamente. (Estava gostando).
- Bonito - ela disse, assim que entramos.
- Quem? Eu? - perguntei.
- Bem... falava do apê.
- Tudo bem.
E mordi-lhe a ponta da orelha.
- Aaaaai! - reclamou.
Puro dengue. Bafejei-lhe o pescoço, passei de leve a língua nas pelancas moles do braço.
- Ligeirinho, hein? - comentou.
- Chamam-me de Mig. Por causa dos jatos russos... e otras cositas más...
Esfreguei minha bunda na dela, rocei a mão na cinta-liga. Assim, nem o Vítor Mature.
- Que coisas? - quis saber.
- Deixa pra depois, baby.
É meu jeito: discreto, evasivo. Primeiro de tudo, o sexo. E lasquei-lhe um chupão atrás do joelho. Sou ágil, criativo.
- Já! - exigiu, tentando livrar a perna.
Meu Deus, adoro isso: mulheres determinadas, chatas mesmo.
- Está bem, está bem - consenti. E acrescentei, orgulhoso:
- É que eu sempre tirava primeiro lugar nos concursos de punheta. E terceiro, também. Venha, baby, vou mostrar-lhe o quarto.
Eu sou assim: sutil, matreiro, oportunista.
Ela subiu na cama e furou o meu colchão com o salto alto. Iniciou uma dança erótica, depois começou a se pelar. Adoro isso. Mulheres pudicas lá fora e sensuais (putonas, mesmo!) aqui dentro. Incentivei:
- Uau, você é o máximo, baby.
Ela adorava elogios. Virou cobra:
- Tian... tiaran...tiaran, tiaran, tiaran... pururu... pururupurum...
Lambia o nariz, os cantos da boca.
- Tesão, coxuda...
Baita diálogo. A coisa estava esquentando. Eu sou assim, sincero, taradão.
Tirou o sutiã. E só com a canhota!
- Parece uma profissional - eu disse.
Ficou tensa, chorou, borrou a maquiagem. Mina em crise, pensei. Gosto disso: lágrimas, porquices. Então comecei eu. Beijei seu umbigo. Fiz bilu-bilu nas dobras da barriga. Arranquei a gravata de bolinhas que ganhei do fotógrafo quando se aposentou e atirei para trás. Prejuízo: voou pela janela. (Dona Maria, do térreo, amanhã me pega). Fiquei só de samba-canção e meias. Vermelhas. Dá um tchan, eu acho. Sou detalhista, erótico. Chamei-a roucamente de gostosa. Pingou baba no ouvido dela. Passei meu joelho num bico de teta. Na maior delas. Foi então que tocou o bip.
- Preciso ir - ela disse.
Pulou da cama e começou a se vestir. Nem acreditei.
- Mas baby... agora que eu ia te mostrar a fodinha rolimã?
Não respondeu. Mandou-me arrancar os sapatos do colchão. Tudo bem, pensei, emergência, coisas de médico. Eu sou assim, compreensivo, mole.
- Me liga depois - ela disse. - Dois, três, três, onze, meia, nove. Tiauzim, não posso perder minha boquinha.
Amarrou firme a peruca. Pegou minha escova de dentes e escovou o dela. Só tinha um, mas era uma perfeição. Apenas uma recapada.
- Ligo daqui a pouco, baby. Me espera - rosnei.
Sei ser mandão, rude. Recostei-me na cama, indignado. Mais tarde, liguei mesmo:
- Diga lá! - voz de macho, bigodudo.
- A Janete taí? - engrossei.
- Saiu para fazer um pograma... Mas tem a Suzi, a Darlene, o Armandão, a Béti Madale...
Bati o telefone. Teleputa. Com bip. Não posso com isso. Sou honesto, moralista, preconceituoso, moderno mesmo. Risquei a Janete do meu caderninho. Sou criterioso, durão. E fiquei resmungando comigo mesmo:
- Dois, três, três, onze, meia, nove. Dois, três, três, onze, meia , nove. Dois, três, três,...

                                                                             - Miguel da Costa Franco -

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