domingo, 17 de abril de 2016

Aos meus caros amigos golpistas



   Neste terrível 17 de abril de 2016, data em que a Câmara Federal votará a admissibilidade do impeachment farsesco de Dilma Roussef, dirijo-me a vocês – amigos, parentes, conhecidos (desconhecidos, por que não?) – para dizer-lhes que espero profundamente que o atentado à democracia não se concretize.

   De um lado, porque espero que a agenda progressista que transformou este País nos últimos 13 anos e resgatou sua soberania não seja interrompida, e nisso admito que possamos discordar, tantos são os pontos de vista.

   Mas, de outro, porque considero que todos os que estão apoiando - em gestos, pensamentos e ações – esta aventura golpista (comandada por um gângster que domina 260 deputados comprados com dinheiro de corrupção, um crápula conspirador da estatura ínfima de Michel Temer, e outras tantas figuras desprezíveis da República, como o sindicalista pelego Paulinho da Força, o escravagista Ronaldo Caiado, o picareta obscurantista Marco Feliciano, o defensor da tortura e da ditadura Jair Bolsonaro, o nefasto senhor feudal José Sarney, o multi-delatado da Lava-jato Aécio Neves – da lista de Furnas e do aeroporto familiar com dinheiro público -, o entreguista José Serra da privataria e da venda do pré-sal, o Alckmin ladrão de merendas, o Beto Richa espancador de professores, os herdeiros da velha Arena Heinze, Germano, Hamm, Marchezan, o procurado pela Interpol Paulo Maluf, o FHC das propriedades mal havidas, o vendedor de sentenças Gilmar Mendes e seu justiceiro discípulo Sérgio Moro, o ladrãozinho do Detran do RN José Agripino, os inúmeros deputados e empresários citados na Lava-jato e os detentores de offshores listados nos Panamá Papers, as sonegadoras Globo e RBS e outros manipuladores da mídia tradicional - Estadão, Folha de São Paulo, Veja, Istoé, Época, Valor, Exame, etc... - e outros tantos congressistas e líderes empresariais acusados de crimes diversos), estão na verdade roubando de 54 milhões de cidadãos brasileiros, entre os quais eu me incluo, a expressão mais direta de sua cidadania: o voto depositado nas urnas em 2014.

   Que posso esperar de nossa relação se és capaz, com a mesma displicência intencional ou ingênua com que me convidas para jantar ou para compartilhar uma festa de aniversário, de suprimir de mim a cidadania pela qual vi tanta gente lutar e sofrer duros e traumáticos golpes? Salve meu padrinho tio Flávio, cassado pela ditadura! Salve meus familiares que sentiram o tacão dos militares em nossa porta! Salve inúmeros amigos de tantos anos, eternos companheiros da luta contra a desigualdade, com quem aprendi a ser melhor a cada dia! Salve meus colegas de faculdade, com quem lutei nos tempos em que o sistema de cotas favorecia, não os pobres e negros, mas os fazendeiros e latifundiários! Salve meu irmão Zeca Moraes, a primeira vítima do anti-petismo abjeto!

   Não posso negar para mim mesmo a profunda decepção que sinto com relação aqueles de vocês, mais próximos e queridos, que apóiam a destituição injusta de Dilma Roussef nesta hora.

   Por isso, espero que o golpe não se concretize. Terei dificuldades para perdoá-los.

   É lógico que com o passar dos anos aceitarei as desculpas sinceras daqueles que amo e que se derem conta da ignomínia que cometeram, ingenuamente manipulados que foram por fontes de informação pretensamente neutras, embora não prometa, por óbvio, conseguir restabelecer o respeito intelectual que já tive antes.

   Mais desprezo hei de sentir pelos que insistirem em suas desculpas esfarrapadas, em demonstrações de cunho fascista anti-isso ou aquilo e na defesa elitista de seus privilégios socialmente ilegítimos.

   Espero que o golpe não tenha sucesso, pois a mancha profunda do golpismo marcará suas testas para sempre, como ficou estampada até hoje em Silvério dos Reis, nos traidores dos lanceiros negros da Revolução Farrroupilha, nos promotores do suicídio de Vargas, nos apoiadores da ditadura militar, nos irresponsáveis da Boate Kiss, ou, mais prosaicamente, em razão das manipulações de tapetão forjadas por Corinthians e Fluminense no país do futebol. E isso é muito ruim. Sempre esperei de vocês que não dessem guarida aos batedores de carteira.

   Não sairemos desse modo espúrio de fazer política com construções farsescas, desconstituindo o respeito pelo voto popular, dando relevo criminoso a meros artifícios contábeis com jurisprudência firmada ou ações institucionais seletivas e com caráter de justiçamento. Muito menos suprimindo a eleição direta em favor das eleições indiretas, como se vislumbra agora.

   Só uma profunda reforma política - cuja proposta, diga-se de passagem, foi de pronto sepultada por Michel Temer em 2013 -, poderá mudar esse quadro nefasto de desordem representativa em que nos metemos.

   Pelo bem de nós todos, espero que o golpe não se concretize.


                                                                             - Miguel da Costa Franco - 

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